terça-feira, 6 de setembro de 2011

Ônibus 174 - análise geral




Com certeza, quem não tem acesso às informações contidas no documentário “Ônibus 174”, tem uma visão diferente sobre a realidade de considerável parte dos “bandidos”. Inicialmente, tem-se a imagem de um Sandro marginal porque assim o quer ser, o documentário mostra um problema para o qual a sociedade brasileira esta tão acostumada com um único pensamento que ao terminar de assistir parece que aquele senso comum foi desmontado. É uma análise e um estudo cuidadoso de situações, levantando um olhar muito mais amplo sobre o “simples” episódio isolado do sequestro do ônibus e seus passageiros, mostrando certa humanidade em alguém que nunca teve privilégios.

Sandro sempre foi invisível, em certo ponto, deixa até a entender que o seu sonho era ser famoso, isso pode ter sido ocasionado do fato de quase sempre ter sido um morador de rua – menino, mulher, idoso, homem, pessoas, seres humanos – todos são, de certa forma, ignorados. Não existe oportunidade, a sociedade não parece apta a recebê-los de maneira alguma, para essas pessoas, só existe o egoísmo, não há preparo das instituições direcionadas para “os sem família”, do governo só há desamparo, não há olhar para esses que, de forma paradoxal, estão tão à vista do mundo. Essas que cresceram sem saber o que é atenção, o que é carinho, tendo apenas maus tratos e desprezo, na rua têm acesso a marginalidade e as drogas, e ninguém para controlar aquilo que parece fácil aos olhos de alguém que ainda esta formando a sua “essência”, corromper-se é de uma facilidade imensurável.

E, infelizmente, há ainda o despreparo policial, tanto em lidar com ocorrências diárias quanto em lidar com o caso do “Ônibus 174”, isso ficou explícito no documentário, policiais sem o equipamento necessário, usando de mímica para a comunicação durante o sequestro, visto que vidas estavam em jogo, é um absurdo, torna-se praticamente uma piada. É visível também a lentidão com a qual eles agiram, e, pode-se dizer, causando uma vítima por terem se precipitado na hora que deveriam agir com lentidão. Além disso, ainda fica transparente a violência com que os policiais atuam em várias situações, muitas vezes desnecessárias, vezes ou outras, sem fundamentos. Eles acabam sendo policiais como um último recurso para um emprego, às vezes, faltando vocação, vontade e em outras análises, passando mais de anos sem qualquer tipo de treinamento, como se a sociedade fosse estável, mas tudo vai se transformando a cada momento.

A polícia aparentemente não sabe pensar de modo a garantir a segurança geral, para a maioria parece que a sua função é apenas prender e matar aqueles que fogem dos padrões normativos, sem pensar na população como um todo. Através do documentário em questão, pode-se observar que o local de sequestro ficou todo desprotegido, não armaram nem um cerco ao redor daquilo tudo, aproximavam-se os que quisessem, inclusive a mídia armou um circo por lá e isso fez com que Sandro se sentisse poderoso, talvez isso até tenha feito com que a situação chegasse a tal ponto, afinal, Sandro sempre quis ser famoso, irônico que tenha conseguido tal plenitude após sua morte. Apesar disso, a mídia tem um papel importante quando se trata de registrar ocorridos, por exemplo, o material colhido nesse episódio serviu perfeitamente como uma denúncia para José Padilha porque ele mostrou o lado que a mídia normalmente não mostra, ele mostrou o lado em que não há vilões e mocinhos, apenas seres humanos em um sistema falho.

Há Sandros em todo o Brasil, em todos os lugares. Pessoas assim são reflexos da falta de cidadania, reflexos de descasos em vários aspectos, a violência esta enraizada na sociedade. Sendo esse o tema que se faz bastante presente durante todo o documentário: a família e a educação como principais agentes de formação da cidadania. É um documentário reflexivo, é aquela questão do “e a culpa é de quem?” sendo preenchida por várias direções, pessoas que vivem à margem da sociedade, alienados que se esforçam em não serem incomodados com a realidade, a incompetência do governo, despreparo policial, inexistência de oportunidades. Cidadania se faz presente no documentário, mas de forma a levantar a questão: onde foi parar tal cidadania?

Nenhum comentário:

Postar um comentário